segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O desafio de construir Ciências Sociais autônomas

Com a presença de pesquisadores dos 5 continentes, encontro sobre dependência acadêmica realizado na Argentina, representa um passo adiante na luta por desenvolver um pensamento crítico não somente na América Latina mas, pode-se dizer, numa dimensão mundial. A presença de estadunidenses e europeus só enriqueceu o debate, apesar de uma parte deles ainda apegar-se a uma pretensa universalidade das Ciências Sociais produzidas no centro do Sistema Mundial. O artigo é de Theotonio dos Santos.
Entre os dias 3 e 6 de novembro realizou-se em Mendoza, Argentina, a II Oficina sobre Dependencia Académica, dirigida por Fernanda Beigel, diretora do PIDAL, Programa de Investigaciones sobre Dependencia Académica en América Latina que funciona na Facultad de Ciencias Políticas y Sociales da Universidad Nacional de Cuyo, com apoio do CONICET e do Programa Sul-Sul do CLACSO.

Com a presença de pesquisadores dos 5 continentes, este encontro representa um passo adiante na luta por desenvolver um pensamento crítico não somente na América Latina mas, pode-se dizer, numa dimensão mundial. A presença de estadunidenses e europeus só enriqueceu o debate, apesar de uma parte deles ainda apegar-se a uma pretensa universalidade das Ciências Sociais produzidas no centro do Sistema Mundial. Mas foi muito emocionante assistir por exemplo a participação por vídeo-conferencia do professor Syed Farias Alatas , da Universidade de Singapura, regatando o papel tão especial da teoria da dependência na superação de uma ciência social criada a serviço de um projeto e uma prática colonialista e imperialista. Ele buscou inclusive destacar os antecedentes asiáticos desta empreitada teórica e empírica que seu famoso pai e outros importantes pensadores filipinos ya haviam iniciado desde o pós guerra. Não foi demasiado ousado, haver chamado a Conferência Pública em que participaram além de Syed Alatas, Enrique Oteiza e eu com a moderação da própria Fernanda Beigel: A tradição dependentista latinoamericana e o desenvolvimento de um circuito acadêmico periférico. 

De fato, além da ampla dimensão regional é interessante apontar a amplitude temática que abordou esta oficina de trabalho.
Figuras de grande peso como Hebe Vessuri, do Instituto de Investigaciones Científicas da Venezuela, Sujata Pael, da University of Hyderabad, Índia, Hernan Sabea da American University of Cairo, Egito, e vários outros discutiram os problemas epistemológicos e teóricos articulados com a especificidade de cada região do sul; a construção de carreiras acadêmicas e a profissionalização no Sul; a importancia dos modelos de desenvolvimento; as alternativas diante da dependencia académica como as pequenas publicações e as agendas de pesquisa não eurocéntricas; a autonomia institucional, a dependencia financeira e o desenvolvimento do campo científico-universitário; a dependencia e a internacionalização das Ciencias Sociais; os desafios epistemológicos e políticos da ciência periférica; a construção de carreiras acadêmicas desde espaços periféricos: desigualdades de acesso à educação superior, mobilidade académica intra-regional e internacional.; a divisão intrnacional do trabalho científico e o intercambio desigual do conhecimento. 

Por esta agenda de debates os leitores podem avaliar a importância de todo um campo temático construido sistematicamente a partir destes seminários que desenvolvem e aprofundam uma problemática muito querida do pensamento crítico latinoamericano.

Creio que Enrique Oteiza, o artífice do Conselho Latino Americano de Ciencias Sociais (CLACSO) dirigido na atualidade por Emir Sader, sintetizou muito bem o espírito desta reunião quando me fez um comentário emocionado:” me sinto feliz de constatar como aquele espírito de debate de nossos tempos está de volta”. E com um forte e estimulante núcleo energético no qual predominam mulheres acadêmicas de ponta e jovens cientistas de todo o planeta com fortes traços étnicos não europeu. É uma resposta contundente aos que dizem que a teoria da dependencia está morta. Havia que perguntar: ONDE?

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